O
cientista britânico Adrian Dubock começa suas palestras sobre o projeto “Arroz
Dourado” sobrepondo dois mapas: o da produção mundial de arroz e o da
deficiência de vitamina A nas populações. Não por coincidência, as áreas em
destaque são as mesmas nos dois mapas. O arroz é a base da alimentação de quase
metade da população mundial, mas o grão não tem vitamina A.
“São
cerca de 2 milhões de mortes de crianças abaixo de cinco anos que poderiam ser
evitadas todos os anos com níveis corretos de vitamina A”, continua Dubock,
gerente do projeto, citando dados calculados a partir de estimativas da
Organização Mundial de Saúde (OMS). Outras 650 mil crianças ficam cegas todos
os anos por falta da vitamina. “Se o arroz dourado poupar a metade das mortes,
1 milhão de vidas por ano, já será uma grande vitória.”
Essa
vitória está cada vez mais perto de se tornar realidade. O projeto está em sua
reta final, e o novo arroz transgênico pode ser liberado comercialmente em 2012
ou 2013, depois de mais de 20 anos de trabalho.
Iniciado
no começo dos anos 1990, o projeto “Arroz Dourado” usou a engenharia genética
para criar uma variedade rica em beta-caroteno, substância que se converte na
vitamina A no corpo humano.
O
nome veio de sua coloração amarelo alaranjado, causada pelo beta-caroteno – a
cenoura, por exemplo, é laranja porque é rica nessa substância.
Agora,
o projeto já cruzou o arroz dourado com as variedades mais produzidas na Ásia,
gerando cinco tipos de arroz idênticos aos plantados hoje, só que dourados.
“Devemos solicitar a liberação comercial do arroz dourado nas Filipinas já no
ano que vem, e depois virão Vietnã, Laos, Bangladesh, Indonésia, Índia e onde
mais houver interesse”, garante Dubock.
Tecnologia
Criar
uma variedade de arroz rica em beta-caroteno não foi simples. Em mais de 20 mil
tipos de arroz catalogados no mundo, a equipe do “Arroz Dourado” não conseguiu
encontrar a característica da alta produção de beta-caroteno. O único caminho
seria introduzir no arroz genes responsáveis pela produção da substância vindos
de outros organismos.
Com
recursos de fundações filantrópicas, empresas e governos, o time de cientistas
conseguiu a primeira planta em laboratório em 2000. O feito rendeu até a capa
da “Time”, a principal revista dos
Estados Unidos, que cravou na manchete o mesmo título desta reportagem: “Este
arroz poderia salvar um milhão de crianças por ano”.
O
potencial do arroz dourado é grande. Primeiro, porque bastam 40 gramas por dia
para evitar os problemas da deficiência de vitamina A. Segundo, porque os
custos são muito mais baixos do que as outras formas de se complementar a dieta
da população com vitamina A. De acordo com estudos mostrados por Dubock,
distribuir pílulas da vitamina, como o governo americano faz na África, pode
custar de 10 a 200 vezes mais caro.
Mas
a principal vantagem é que o arroz dourado será gratuito para os agricultores. Os
dois alemães que o inventaram, Ingo Potrykus (que ilustra a capa da Time) e
Peter Beyer, doaram a tecnologia para que não haja nenhuma cobrança para os
produtores.
Política
no caminho
Em
visita ao Brasil para participar do seminário de 10 anos do Conselho de
Informações sobre Biotecnologia (CIB), nesta segunda (03), Dubock criticou a
burocracia e a interferência política no processo de análise de organismos
geneticamente modificados em diferentes países. “Mais de uma década depois de
concluído em laboratório, o arroz dourado ainda busca aprovação”, reclama ele.
Se
os produtores ou consumidores não quiserem adotar o arroz dourado, ou desistam
dele, é fácil identificá-lo pela cor. “Temos uma solução fácil, gratuita e
segura, e temos pessoas morrendo, então não vejo muita dúvida sobre sua
aceitação”, diz o gerente do projeto.
Fonte: SouAgro
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